
Está reportagem saiu publicada no Jornal Bom Dia - 27/09/2006
Apontados para a história
Veteranos moradores redescobrem a cidade em que vivem ao conhecer detalhes sobre a cultura, a arquitetura e a vocação de Bauru em passeio.
Um grupo de 30 idosos participou de uma caminhada pelo Centro para marcar o Dia Nacional do Idoso e o Dia Internacional do Turismo, ontem. O passeio parte da 8ª Semana Municipal da Terceira Idade, que vai até amanhã reuniu bauruenses e “forasteiros” que adotaram a cidade ao longo da vida.
Eles visitaram a praça Rui Barbosa, percorreram o Calçadão da Batista de Carvalho, estiveram no Museu Ferroviário e conheceram o cerrado nativo da Unesp.
Logo na saída para a caminhada, em frente ao Sesc (Serviço Social do Comércio), um depoimento emocionado de Benedita Carneiro Guerreiro, 64 anos, contagiou o grupo. A moradora da quadra 7 da avenida Aureliano Cardia, na Vila Cardia, conta aos colegas de Sesc o dia em que foi colocada a pedra fundamental do clube.
Ela viu. “Era uma tarde muito movimentada, mas não existia casa, nada na avenida”, lembra.
E se emociona, porque foi no Sesc onde encontrou força, depois de perder dois filhos de 14 anos e o marido, em dois acidentes, há 22 anos.“Encontrei estímulo no Sesc, com pessoas da terceira idade como eu, com problemas iguais ou até piores. Hoje, vivo uma vida normal.”
A aposentada Alice Chioca, 81 anos, é “história viva” ao falar de ferrovia. “Era um movimento enorme de gente que vinha nos trens carregados. Vi a Noroeste começar, quando trouxeram máquinas para drenar um brejo enorme que era a área da estação. Apesar da tristeza, é uma grande alegria poder contar como era e no que se transformou.”
Da jardineira ao planador
O presidente do Comupi (Conselho Municipal da Pessoa Idosa), Ubaldo Benjamim, 66, avalia que o passeio pelo Centro histórico é uma atividade que contribui com o bem- estar dos idosos.
Ele também se lembrou dos anos 60 ao passar pela quadra 7 da Batista de Carvalho. “Onde hoje é a loja Unidas foi o Banco Novo Mundo. Eu trabalhei lá durante sete anos e tomava o ônibus jardineira para fazer um curso de planador lá no aeroclube”, conta.
“São muitas referências, recordações. Hoje a gente sente que Bauru, embora com o progresso, já é uma cidade completamente diferente.”
Rui Barbosa, memória e jacaré
Quando chegam ao Centro, os idosos encontram uma praça Rui Barbosa bem diferente daquela guardada na lembrança. Em frente à catedral do Divino Espírito Santo, o sentimento que envolve o ferroviário aposentado Irany de Castro, 78, é a saudade.
“Esse jardim aqui era muito lindo, com arvoredos grandes, bancos de granito. Tinha peixes de várias espécies, animais de pequeno porte como patos, coelhos. E duas pontes que atravessavam dois lagos, com as bordas imitando madeira, por onde passavam casais de namorados e famílias.” Alguns se lembram até de pequenos jacarés nos lagos da praça. Castro mantém vivo na memória um verdadeiro mapa do Centro nas décadas de 1950 e 60.
Em dez minutos de conversa ao lado do coreto, ele lembra um a um os estabelecimentos comerciais da época e o tempo em que entregava panfletos nas casas para ganhar um ingresso e assistir, de graça, a uma sessão de terça-feira no antigo Cine Bauru. “Terça era a sessão dos ‘pão-duros’. Era mais barata.” O Automóvel Clube, na rua Primeiro de Agosto, é um dos orgulhos preservados pelo tempo.
Já a Casa Lusitana, na esquina do calçadão com a rua Gustavo Maciel, ficou na memória e num relógio que não funciona mais.
O grupo de idosos foi acompanhado pelo professor de ecologia vegetal Osmar Cavassan, da Faculdade de Ciências da Unesp (Universidade Estadual Paulista). “A praça era bem diferente, tinha arquitetura baseada em temas naturais e era muito mais arborizada”, afirma. “Dela, ficaram poucos elementos, entre eles o coreto.”
27/09/2006 Thárcio de Luccas